Vampirismo bacteriano: descoberto que o sangue humano atrai alguns patógenos mortais

Foi descoberto que algumas bactérias são atraídas pelo sangue humano, pois contém nutrientes que podem ser usados como alimento por elas. Isso traz luz sobre as infecções na corrente sanguínea e os possíveis tratamentos.

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Micrografia eletrônica de baixa temperatura de um grupo de bactérias Escherichia coli, ampliada 10.000 vezes. Cada bactéria tem formato oval e está entre as bactérias que são atraídas pelo sangue humano. Imagem: USDA/EUA.

Algumas das bactérias mais mortais do mundo procuram e se alimentam de sangue humano, um fenômeno recém-descoberto que os pesquisadores chamam de “vampirismo bacteriano”. Uma equipe liderada por pesquisadores da Universidade Estadual de Washington (WSU) descobriu que as bactérias são atraídas pela parte líquida do sangue, ou soro, que contém nutrientes que elas podem usar como alimento.

Algumas das bactérias que mais comumente causam infecções na corrente sanguínea detectam uma substância química no sangue humano e "nadam" até ela.

De acordo com o que foi revelado pelo site EurekAlert!, um dos produtos químicos que parecia atrair especialmente as bactérias era a serina, um aminoácido presente no sangue humano que também é um ingrediente comum em bebidas proteicas. Os resultados desta pesquisa foram publicados na revista eLife em 16 de abril. Arden Baylink, professor da Faculdade de Medicina Veterinária da WSU e um dos autores da pesquisa, disse: “As bactérias que infectam a corrente sanguínea podem ser letais".

Baylink e a principal autora do estudo, Siena Glenn, estudante de doutorado da WSU, descobriram que pelo menos três tipos de bactérias, Salmonella enterica, Escherichia coli e Citrobacter koseri, são atraídos pelo soro humano. Essas bactérias são uma das principais causas de morte de pessoas que sofrem de doenças inflamatórias intestinais (DII), cerca de 1% da população. Esses pacientes geralmente apresentam sangramento intestinal que pode ser porta de entrada de bactérias na corrente sanguínea.

Atração química

Como destaque do estudo, os pesquisadores determinaram que a Salmonella possui um receptor de proteína especial chamado Tsr, que permite à bactéria detectar o soro e 'nadar' em direção a ele. Usando uma técnica chamada cristalografia de proteínas, eles conseguiram ver os átomos da proteína que interagem com a serina. Os cientistas acreditam que a serina é uma das substâncias químicas do sangue que as bactérias detectam e consomem.

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"Ao aprender como estas bactérias são capazes de detectar fontes de sangue, no futuro poderemos desenvolver novos medicamentos que bloqueiem esta capacidade. Esses medicamentos podem melhorar a vida e a saúde das pessoas com DII que apresentam alto risco de infecções da corrente sanguínea", disse Glenn ao site EurekAlert!.

Também participaram da pesquisa cientistas da Universidade de Oregon, e ela foi financiada pela WSU e pelo Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos (NIAID). Glenn indicou que “essa substância química que está em nosso sangue e que usamos como alimento também é algo que essas bactérias patogênicas reconhecem como alimento”. Daí o termo “vampirismo bacteriano”, que explica esse processo de alimentação de algumas bactérias atraídas pelo sangue humano.

Patógenos prioritários

As bactérias analisadas pelos pesquisadores são chamadas de patógenos Enterobacteriaceae multirresistentes, que a Organização Mundial da Saúde (OMS) rotulou de "patógenos prioritários". Estes patógenos pertencem a um grupo de 12 famílias bacterianas consideradas a ameaça mais importante à saúde humana devido à sua resistência aos antibióticos, declarou a OMS.

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Modelo de vampirismo bacteriano: O soro contém altas concentrações de serina e outros quimioatraentes, que são reconhecidos pelos quimiorreceptores, incluindo o Tsr, para conduzir os táxis de Enterobacteriaceae para o soro.

Enterobacteriaceae também podem ser “patógenos oportunistas que causam diferentes tipos de infecções, como infecções do trato urinário, pielonefrite, sepse, pneumonia e meningite”, segundo a Health Canada. Baylink explicou ao Global News que as pessoas com doenças inflamatórias intestinais (DII), como a doença de Crohn e a colite ulcerosa, são especialmente vulneráveis a estas bactérias, que normalmente residem no intestino.

Para o trabalho, os pesquisadores usaram um microscópio de alta potência e simularam uma hemorragia intestinal injetando quantidades microscópicas de soro humano e observando como as bactérias navegavam em direção à fonte. "As bactérias são organismos microscópicos que não têm olhos nem ouvidos. Mas têm algo análogo ao olfato. O sentido do olfato que as bactérias possuem é um comportamento chamado quimiotaxia. Uma das principais funções da quimiotaxia é a busca por alimento", explica Baylink.

Referência da notícia:

Glenn, S. J. et al. Bacterial vampirism mediated through taxis to serum. eLife, 2024.