A crise climática do Rio Grande do Sul: impactos para a agricultura com a chegada do inverno

Enquanto o estado avalia danos e se prepara para junho com chuvas abaixo da média e geadas possíveis, agricultores e especialistas agrometeorológicos adaptam práticas para assegurar a produtividade das culturas de inverno em um clima desafiador.

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Espigas amarelas de trigo ao pôr do sol.

No mês de maio de 2024, o Rio Grande do Sul foi cenário de uma das mais severas catástrofes climáticas de sua história. Registros pluviométricos extremos causaram deslizamentos de terra e enchentes devastadoras, impactando diretamente a infraestrutura e a agricultura da região.

O Conselho Permanente de Agrometeorologia Aplicada do Estado do Rio Grande do Sul (COPAAERGS) divulgou um boletim extraordinário que detalha as severas condições climáticas e as consequências desses eventos no estado. Entre 27 de abril e 2 de maio, várias cidades gaúchas enfrentaram uma situação crítica com volumes extremos de chuvas. Por exemplo, Agudo registrou 527,6 mm de precipitação, enquanto Tupanciretã e Bossoroca alcançaram 490,6 mm e 509,2 mm, respectivamente. Estes valores representam cerca de um terço da precipitação anual esperada, destacando a magnitude excepcional deste evento climático sobre a região.

O Rio Grande do Sul enfrenta desafios sem precedentes

A Defesa Civil relatou que 469 dos 494 municípios do estado foram afetados, levando a perdas significativas, tanto humanas quanto de animais, milhares de desalojados e danos a casas, indústrias e infraestruturas de transporte.

Embora o setor agropecuário tenha sido um dos mais afetados, o timing do evento minimizou as perdas de grãos, visto que a maioria das lavouras já havia sido colhida. No entanto, os prejuízos foram significativos no que tange à infraestrutura de armazenamento e transporte, essenciais para a economia do estado.

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Campo de soja inundado na primavera pelo desastre natural.

A erosão do solo, agravada pelas chuvas intensas, prejudicou sua estrutura química, física e biológica. Esse fenômeno pode comprometer as safras futuras, incluindo a de inverno de 2024, e afetar negativamente os cultivos perenes nos próximos ciclos produtivos. A recuperação dessas áreas exigirá esforços intensivos em análises e correções de solo.

Previsão para junho e medidas preventivas

As projeções climáticas para junho de 2024, segundo o INMET, indicam chuvas abaixo da média no sul do estado, mas com temperaturas ligeiramente acima da média no norte. Ainda assim, não se descarta a possibilidade de geadas em locais de maior altitude devido à entrada de massas de ar frio.

Este cenário apresenta desafios e oportunidades únicas para as culturas de inverno, como trigo, aveia e cevada, que são sensíveis tanto às variações de temperatura quanto à disponibilidade hídrica.

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Mapa de anomalia da temperatura média mensal na América do Sul para junho de 2024

A escassez de chuva pode limitar a disponibilidade de água necessária para o desenvolvimento inicial dessas culturas, especialmente em estágios críticos de germinação e enraizamento. Por outro lado, temperaturas mais altas no norte do estado podem acelerar o ciclo vegetativo das plantas, o que, se não for acompanhado por uma gestão adequada de irrigação e nutrientes, pode resultar em estresse hídrico e redução do potencial produtivo.

As geadas, por sua vez, representam um risco considerável, particularmente para o trigo, que pode sofrer danos em seus tecidos quando exposto a temperaturas muito baixas. A ocorrência de geadas após o plantio pode devastar brotações jovens e afetar negativamente a densidade do stand, levando a uma diminuição significativa nos rendimentos finais.

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Mapa de anomalia de precipitação média mensal na América do Sul para junho de 2024

O COPAAERGS sugere várias medidas de recuperação e preparação para os agricultores, incluindo análise e correção do solo, implementação de práticas de manejo para prevenir futuros danos e recomposição de áreas de preservação ambiental.

Diante dos desafios apresentados, há também oportunidades para melhorar a resiliência das práticas agrícolas. Iniciativas como a implementação de sistemas agroflorestais e a adoção do plantio direto podem ajudar a mitigar os impactos de futuros eventos climáticos extremos.

Desafios e oportunidades futuras

A reestruturação das áreas agrícolas também oferece uma chance para repensar a utilização do território, favorecendo práticas que respeitem mais as capacidades do solo e a biodiversidade local.

O caminho para a recuperação e a adaptação às novas realidades climáticas será longo para o Rio Grande do Sul.

Com o apoio de instituições como o COPAAERGS e o acompanhamento contínuo das condições meteorológicas e climáticas, os agricultores podem não apenas recuperar-se, mas também prosperar em um futuro marcado por incertezas climáticas.

As lições aprendidas agora irão moldar a resposta do estado a eventos semelhantes no futuro, destacando a importância crítica de uma agrometeorologia robusta e proativa.