Chuvas volumosas na Austrália e Brasil estão associadas a um mesmo fenômeno
Nessa primavera, partes da Austrália e da porção Centro-Sul do Brasil estão registrando chuvas muito acima do esperado e o principal padrão climático responsável por essas chuvas é o mesmo, e não é a La Niña! Mas então, qual é esse padrão?
Nos últimos dias diversas partes do mundo têm enfrentado chuvas volumosas que tem causado uma série de vítimas e prejuízos milionários. São diversos os fatores meteorológicos e climáticos que estão provocando essas chuvas pelo mundo. Porém, para alguns desses locais, o fator por trás dessas chuvas é o mesmo!
A primavera de 2022 tem sido extremamente chuvosa para grande parte da Austrália. A cidade de Sydney está vivendo o mês de outubro mais úmido de todos os tempos, até esta segunda (24) a cidade já registrou 286,8 milímetros de chuva no mês, o maior acumulado em 165 anos de registros. E não é só esse mês, desde o início de 2022, Sydney já acumulou 2387,6 mm de chuva, se firmando facilmente como o ano mais chuvoso já registrado na cidade, ultrapassando o antigo recorde de 2194 mm estabelecido em 1950.
No Brasil, partes das regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul também têm registrado episódios de chuvas extremas e volumosas desde o início da primavera. Setembro foi um mês mais chuvoso que o normal para os estados de Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná e partes de Minas Gerais, Santa Catarina e Mato Grosso.
Em outubro as chuvas volumosas continuaram, principalmente no oeste dos estados do Paraná e Santa Catarina. Algumas barragens chegaram a transbordar em Santa Catarina e, devido às chuvas volumosas e consequente cheia dos rios da região, as Cataratas do Iguaçu registraram uma vazão muito acima do normal!
Tanto no Brasil quanto na Austrália temos observado uma grande atividade de ciclones e sistemas frontais, e a sucessiva passagem e formação desses sistemas tem colaborado para esses volumes expressivos de chuva. Mas que grande padrão atmosférico poderia estar modulando esses sistemas nessas duas regiões tão distantes? Seria a La Niña? Talvez não.
Se não é a La Niña, qual padrão estaria provocando essas chuvas?
Apesar do El Niño Oscilação Sul (ENOS) ser o maior padrão de variabilidade do planeta, ele não é o único a modular o clima em regiões distantes da Terra, mesmo quando está ativo! No momento estamos vivenciando uma fase negativa do ENOS, a La Niña, que está caminhando para seu terceiro pico consecutivo no verão que se aproxima. Mas no momento a La Niña, por ainda estar num novo processo de intensificação, não é o principal padrão climático a modular os sistemas meteorológicos pelo mundo.
Um outro padrão está atingindo seu pico de intensidade máxima no meio dessa primavera, a fase negativa do Dipolo do Oceano Índico (DOI)! Essa fase do dipolo é caracterizada por águas mais frias que o normal na porção oeste do Oceano Índico, próximo a costa leste da África e águas mais quentes que o normal no leste do Índico, sobre a região da Indonésia e norte da Austrália.
Essas águas mais quentes no leste do Oceano Índico são responsáveis por aumentar a ocorrência de sistemas de baixa pressão no sudeste da Austrália, bem como a quantidade de umidade e calor na atmosfera, fazendo com que a convecção associada a esses sistemas seja ainda mais intensa. Isso explica a maior ocorrência de chuvas volumosas e inundações no leste do país, principalmente entre os meses de setembro e outubro.
Já para o Brasil o impacto do Dipolo do Oceano Índico vem através de um trem de ondas atmosférico (as chamadas ondas de Rossby), que parte do leste do Índico e chega até a porção subtropical do Atlântico Sul, próximo a costa sudeste da América do Sul. No caso da fase negativa do dipolo, o padrão de ondas que é disparado geralmente acaba favorecendo uma circulação ciclônica próxima à costa entre as regiões Sul e Sudeste. Isso quer dizer que provavelmente teremos uma maior atuação e frequência de ciclones e sistemas frontais nesta região.
Essa configuração condiz com o que temos observado nas últimas semanas: a passagem de cavados pelo interior do continente causam instabilidades e dão início ao processo de formação de ciclones que se configuram sobre o oceano, fazendo com que toda parte norte da região Sul, sul e oeste da região Centro-Oeste e a região Sudeste fiquem suscetíveis a grandes acumulados de chuvas, enquanto o Rio Grande do Sul registra condições mais secas que o normal.