Cientistas propõem criar repositório na Lua como “backup” para salvar a biodiversidade da Terra

É isso mesmo. Cientistas querem criar um abrigo no lado gelado e escuro da Lua que serviria como um “backup” para a vida na Terra, salvando assim as espécies ameaçadas de extinção.

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As crateras da Lua que nunca recebem luz solar podem servir como abrigo para as amostras de espécies terrestres ameaçadas de extinção. Crédito: Scientific Visualization Studio/NASA.

Mais uma forma de tentar preservar a vida da Terra diante da crise climática atual e dos fenômenos meteorológicos extremos. Em um projeto audacioso, uma equipe de cientistas, liderada pela pesquisadora Mary Hagedorn, do Instituto Nacional de Zoologia e Biologia da Conservação do Smithsonian, propõe usar as áreas frias e escuras da Lua para guardar amostras congeladas de espécies em risco de extinção na Terra, garantindo assim o futuro da biodiversidade.

Segundo a equipe, as ameaças das mudanças climáticas e da perda de habitat ultrapassam nossa capacidade de proteger as espécies em seus habitats naturais, necessitando de uma ação urgente.

Terremotos, furacões, vulcões e tsunamis podem extinguir 10% das espécies de vertebrados, o que equivale a 4 mil espécies potencialmente ameaçadas na Terra, segundo um estudo.

Essa ideia foi publicada recentemente em um artigo na revista BioScience. Nele, os pesquisadores observam que “uma grande proporção de espécies e ecossistemas enfrentam ameaças de desestabilização e extinção que estão acelerando mais rapidamente do que a nossa habilidade de salvar essas espécies em seus habitats naturais”.

Como guardar as amostras de espécies terrestres na Lua?

A ideia dos pesquisadores é criar um repositório de material celular, que permitiria a preservação de amostras por meio de fibras celulares capazes de se ligar a tecidos ou órgãos. Com a criopreservação (uma técnica em que as células são armazenadas em temperaturas tão baixas que toda a atividade biológica para), o material celular seria congelado e induzido a um estado de animação suspensa com a ajuda das condições lunares. Depois, as amostras poderiam até ser clonadas, no pior cenário de extinção.

Para isso, seriam aproveitadas as crateras profundas perto dos polos lunares que nunca são expostas à luz solar. E segundo eles, são várias as vantagens de fazer isso na Lua: lá as amostras estariam protegidas da atual crise climática, dos eventos geopolíticos e dos desastres naturais que acontecem aqui na Terra.

Os polos lunares têm regiões em sombras permanentes (como o fundo de crateras), onde as temperaturas chegam a -196 ºC.

O ambiente frio da Lua tem as condições necessárias para que as amostras permaneçam congeladas o ano todo sem a necessidade de envolvimento humano ou de uma fonte de energia.

Contudo, os pesquisadores reconhecem que o projeto é ousado e que há uma série de desafios para colocá-lo em prática, como questões biológicas, o armazenamento adequado das amostras para o lançamento ao espaço, a necessidade de uma colaboração internacional e as amostras teriam que ser protegidas dos altos níveis de radiação na Lua. Mas, ainda assim, segundo eles, isso é possível.

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Imagem da cratera Giordano Bruno no lado oculto da Lua feita pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter da NASA. A altura e a nitidez da borda são evidentes, assim como as colinas onduladas e a natureza acidentada do fundo da cratera. Crédito: NASA/Goddard/Arizona State University.

E além das espécies que enfrentam o risco iminente de extinção, o biorrepositório proposto priorizaria espécies com funções importantes em seu ambiente e cadeias alimentares.

“Sabemos como fazer isso e que podemos fazer isso, e que vamos fazer, mas pode levar décadas para finalmente conseguirmos”, ressaltou Hagedorn.

Como próximos passos, a equipe precisa encontrar uma forma de preparar as amostras criopreservadas para a viagem espacial, bem como o transporte delas até à Lua.

Referência da notícia:

Hagedorn, M. et al. Safeguarding Earth's biodiversity by creating a lunar biorepository. BioScience, 2024.