Do desastre à esperança: como famílias transformaram rejeitos em hortas produtivas em Minas Gerais
Famílias atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), estão transformando rejeitos em hortas produtivas. Com técnicas agroecológicas, como bokashi e bananeiras, elas recuperam solos e resgatam a agricultura de subsistência, renovando esperanças.
A tragédia do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), marcou para sempre a história de Minas Gerais e do Brasil. Em novembro de 2015, milhões de metros cúbicos de rejeitos invadiram comunidades, destruíram ecossistemas e deixaram milhares de pessoas sem suas terras e meios de subsistência.
Quase uma década depois, a força da comunidade e iniciativas de recuperação começam a mudar esse cenário. Com o projeto "Quintais Saudáveis", lançado para auxiliar famílias a recuperar a capacidade de cultivar seus terrenos, a resiliência deu lugar à esperança. Este artigo explora as inovações e os desafios enfrentados para transformar rejeitos em alimento.
Quintais que alimentam: a reconstrução da agricultura familiar
O projeto "Quintais Saudáveis" foi uma iniciativa criada para devolver às famílias atingidas a possibilidade de cultivar alimentos em suas propriedades. Após o desastre, a camada de rejeitos que cobriu os quintais se mostrou uma barreira para o plantio, pois o material, composto em grande parte por areia, tornava o solo inadequado para o desenvolvimento das plantas.
Com um investimento de R$ 6,5 milhões, o programa ofereceu às famílias suporte técnico e materiais para implementar diferentes tipos de cultivo. Os moradores puderam escolher entre atividades como hortas, pomares, paisagismo, criação de abelhas e até piscicultura. A iniciativa não apenas trouxe resultados produtivos, mas também resgatou o vínculo das comunidades com a terra, promovendo segurança alimentar e autonomia.
Soluções criativas para solos desafiadores
A recuperação dos solos afetados exigiu inovação e trabalho árduo. As primeiras tentativas de cultivo foram frustradas pela presença da camada de rejeitos, que dificultava o crescimento de raízes e a retenção de nutrientes. Para superar esses desafios, técnicas agroecológicas foram introduzidas.
Outra técnica inovadora foi a inclusão de pseudocaules de bananeira nos berços de plantio, funcionando como uma fonte natural de água, nutrientes e micro-organismos. Esses métodos ajudaram a transformar terrenos inférteis em áreas produtivas.
Colheitas e resultados promissores
Os quintais revitalizados já começaram a produzir alimentos que antes pareciam impossíveis de cultivar. Entre os exemplos mais comuns estão a mandioca, o milho, o quiabo, a alface, a abóbora e ervas como a cebolinha. Além disso, algumas famílias optaram por plantar árvores frutíferas, como maracujá, laranja e tangerina. Embora certas culturas ainda enfrentem desafios no desenvolvimento, os resultados iniciais mostram que a recuperação é viável.
O projeto também abriu espaço para a diversificação. Em muitos casos, os quintais não apenas voltaram a alimentar as famílias, mas também proporcionaram paisagens renovadas, com flores e plantas ornamentais. A possibilidade de escolher as atividades trouxe flexibilidade e respeitou as preferências de cada família, promovendo uma recuperação mais personalizada e efetiva.
Legado e desafios para o futuro
Embora o projeto "Quintais Saudáveis" tenha sido concluído em dezembro de 2024, seu impacto continua a ser sentido nas comunidades atingidas. Ele deixou como legado a valorização de práticas agrícolas sustentáveis e a prova de que a resiliência humana pode superar até mesmo os cenários mais desafiadores.
No entanto, os quintais ainda enfrentam dificuldades, como o crescimento lento de certas culturas e a necessidade de assistência contínua para manter os solos produtivos.
A recuperação das terras atingidas e das vidas das famílias não é apenas uma questão técnica, mas também social e ambiental. O acordo de R$ 170 bilhões entre Samarco, Vale, BHP e os governos envolvidos é um passo importante, mas as ações de reparação precisam ser acompanhadas de maneira eficiente para garantir que iniciativas como essa se perpetuem.