Previsão do La Niña: ainda não há consenso para a chegada do fenômeno em 2024. Entenda os motivos
O El Niño ainda nem acabou e agências como a NOAA já colocaram o mundo em alerta para uma possível La Niña no segundo semestre de 2024! Mas será que esse retorno da La Niña já é certo?
A fase positiva do El Niño - Oscilação Sul (ENOS), o El Niño, segue ativo no Pacífico Tropical. Porém, o fenômeno já passou de sua fase intensa e agora está se desintensificando gradualmente, o que nos indica que em breve estaremos na fase neutra do ENOS.
Com esses primeiros sinais de enfraquecimento do El Niño, antes mesmo de chegarmos a fase neutra, muitos já começaram a especular sobre um provável retorno da La Niña ainda neste ano. Diversos modelos climáticos já começaram a apostar numa La Niña se desenvolvendo no início do segundo semestre de 2024.
Além das previsões dos modelos, alguns padrões oceânicos e atmosféricos observados sustentam a ideia da formação de uma La Niña ainda em 2024. Por esses motivos, a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), em sua última atualização de status e prognóstico do ENOS, além de dar continuidade ao alerta de El Niño (El Niño Advisory), também sinalizou um estado de vigilância de La Niña (La NIña Watch).
Essa atualização pegou muitos de surpresa, pois normalmente esperamos um evento de ENOS finalizar antes de inferir sobre a formação de uma outra fase do ENOS. Por esse motivo, algumas discordâncias surgiram entre especialistas na área, junto a muitas incertezas. Uma dessas discordâncias envolve os prognósticos de dois grandes centros internacionais de referência em monitoramento e previsão do ENOS, a NOAA e a Bureau of Meteorology (BOM), da Austrália.
Discordância entre as principais agências internacionais
Enquanto a NOAA anunciou que já está atenta a provável formação de uma La Niña neste ano, a BOM coloca que o El Niño ainda está em andamento, mostrando sinais de enfraquecimento, e ainda não é possível inferir nada a respeito da La Niña antes da dissipação do El Niño, devido às grandes incertezas em torno das previsões e da atual situação do acoplamento oceano e atmosfera sobre o Pacífico.
Parte da discordância desses dois centros se refere aos diferentes indicadores usados para analisar as probabilidades de desenvolvimento do ENOS. Além dos limiares de anomalias de TSM serem mais elevados, os climatologistas da BOM avaliam se o atual estado do sistema climático atinge determinado nível requerido em um conjunto de critérios oceânicos e atmosféricos para inferir determinado estágio do ENOS. Enquanto que para a NOAA, certas condições oceânicas já são o suficiente para emitir um status de vigilância do ENOS.
Isso justifica o que acontece no momento, onde vemos que o El Niño está se desintensificando, a atmosfera já deixou de estar acoplada a esse padrão oceânico e as águas mais quentes têm perdido força no pacifico tropical. Porém, ainda não estamos registrando anomalias frias de Temperatura da Superfície do Mar (TSM) no Pacífico e a atmosfera ainda não apresenta uma resposta da La Niña, o único sinal que temos no momento, que indica uma provável La Niña, são as águas mais frias que o normal que se propagam nos níveis mais profundos do oceano, mas ainda longe de alcançarem a superfície na porção leste do Pacífico tropical.
Essas condições em subsuperfície aliadas às previsões oceânicas dos modelos fizeram com que a NOAA mudasse seu status para “vigilância de La Niña”. Porém, outro ponto a ser levado em consideração é a incerteza das previsões dos modelos nessa época do ano!
A barreira de previsibilidade dos modelos climáticos
A barreira de previsibilidade do outono (primavera), para aqueles que vivem no Hemisfério Sul (Norte), é muito conhecida pelos especialistas em previsão climática. Durante o outono o desempenho dos modelos cai drasticamente e suas previsões não são tão precisas e acuradas, principalmente em relação ao ENOS, por isso geralmente tomamos cuidado ao inferimos algo com base nas previsões antes e durante essa época do ano.
Um dos motivos dessa baixa previsibilidade dos modelos é porque a primavera é a época de transição para o ENOS, ou seja, nesse período do ano geralmente o ENOS está mudando de fase.Na linguagem dos especialistas em variabilidade do clima, essa é uma época em que os sinais são baixos e o ruído é alto. Nesse tipo de situação as previsões se tornam mais difíceis e dispersas.
Para um modelo é mais difícil prever o início ou o fim de um evento de ENOS do que prever a evolução e as consequências de um evento que já está ocorrendo. Além disso, durante o outono o acoplamento entre o oceano-atmosfera é mais fraco, devido a uma redução nos gradientes de TSM sobre o Oceano Pacífico Tropical, o que dificulta a interpretação do estado do sistema climático por parte dos modelos.