Probabilidade de 60% para La Niña: o que de fato isso representa?
O instituto de clima da Universidade de Columbia, o IRI, na sua última atualização sobre as condições do Pacífico Equatorial aumento a chance de ocorrência do fenômeno La Niña para 60%. Mas o que essa probabilidade representa. Haverá La Niña ou não?

A temperatura das águas superficiais do Pacífico Equatorial sempre são motivo de discussão e de análise, não por menos, uma vez que a sua condição térmica é responsável em determinar uma média climática de boa parte do globo, através dos fenômenos El Niño e La Niña.
Desde o início do ano, alguns modelos climáticos apontavam a possibilidade da ocorrência de um La Niña de fraca intensidade, no entanto, outros já mostravam uma condição mais neutra e, até mesmo, ligeiramente aquecida para a região Niño3.4, a mais central e também a mais influente do Pacífico Equatorial.
#Clima #LaNina
— Tiago C. Robles (@tiagocrobles) September 8, 2020
Condições atuais da região do Pacifico Equatorial mostram resfriamento em todas as regiões, com destaque para as regiões Niño 3 e Niño 3.4 cujas anomalias estão em -1,3°C e -0,9°C, respectivamente. pic.twitter.com/9gKSxD0oRX
Por volta do mês Abril, iniciou-se um resfriamento mais intenso seguido de um período de pouca variação até Julho. A partir deste último mês, as águas voltaram a resfriar a uma taxa semelhante ao que foi observado em Abril, até o momento. Na última atualização a anomalia de temperatura da superfície do mar (TSM) do Niño 3.4 está em -0,9°C, com previsão de se intensificar.
No entanto, esse resfriamento ainda não exerce influência sobre o Brasil, somente em regiões mais próximas, uma vez que para afetar a circulação global, circulação de Hadley-Walker, são necessários em torno de 3 meses consecutivos de uma condição abaixo de -0,5°C. Já para fins de classificação do fenômeno são necessários 7 meses consecutivos.
Qual o fator responsável pelo resfriamento?
Um dos fatores que ajudam no aquecimento ou resfriamento do Pacífico Equatorial são as correntes oceânicas, que algumas acabam por convergir para a porção central do oceano. Estamos falando da Corrente da Califórnia, na costa oeste dos EUA, e de Humboldt, na costa oeste da América do Sul.
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— Tiago C. Robles (@tiagocrobles) September 8, 2020
Condições atuais para anomalia de temperatura da superfície do mar (TSM) mostra o resfriamento no Pacífico Equatorial e no Pacífico Sul. A Corrente de Humboldt favorece o transporte mais efetivo de águas frias para as regiões Niño 3 e Niño 3.4. pic.twitter.com/U0S904hBEQ
Como há um deslocamento em relação às Américas, sendo a América do Norte mais para oeste e a América do Sul mais para leste, cada corrente acaba contribuindo diferentemente para cada região do Pacífico Equatorial. A corrente de Humboldt, na média, é mais influente para as regiões Niño 3 e Niño 3.4, e até mesmo para o Niña 1+2, enquanto que a da Califórnia favorece a porção mais oeste do Niño 3.4 e leste do Niño 4.
Assim, com um Pacífico Sul mais frio, o resfriamento das regiões Niño 3.4 e Niño 3 é favorecido, no entanto, a Corrente da Califórnia pode atrapalhar futuramente a manutenção do fenômeno. Além disso, o próprio Pacífico Sul possui uma tendência de aquecimento reforçando o enfraquecimento do La Niña no próximo ano.
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Representação dos ventos alísios que convergem para a região equatorial. Sua condição mais fraca contribui para água mais quentes no oeste do Pacífico. pic.twitter.com/BrNDxL7UG8
Vale ressaltar que o aquecimento na região mais a oeste do Oceano Pacífico se dá, principalmente, pelo enfraquecimento dos ventos alísios fazendo com que a água da superfície se aqueça e se desloque para oeste, uma vez que, mesmo mais fraco, os ventos de sentido leste-oeste continuam atuando. Quando são mais intensos do que a média, podem resfriar a superfície provocando o efeito inverso.
O que está por trás da probabilidade de 60%?
A previsão probabilística para ENOS do Internacional Research Institute for Climate and Society (IRI) é baseada na previsão de 18 modelos dinâmicos e de 8 modelos estatísticos. Mas será que todos os modelos representam um cenário real provável que respeita as premissas condicionadas pelos fatores atuais de resfriamento do Pacífico Equatorial discutidos no item anterior?
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18 modelos dinâmicos e 8 modelos estatísticos compõe a previsão probabilística do IRI/CPC. Alguns não conseguem "enxergar" o transporte de água mais fria do Pacífico Sul para o Pacífico Equatorial. pic.twitter.com/57NGARayMd
Através da discussão anterior sobre as condições atuais e as que influenciaram o resfriamento do Niño 3.4, não estão correspondendo às premissas proporcionadas pelo transporte das correntes de marítimas, mostrando uma tendência de aquecimento até o final do ano. Esses modelos acabam por “contaminar” o resultado, forçando uma probabilidade menor para La Niña.
Assim, ao desconsiderar esses modelos com tendências duvidosas, a probabilidade para a ocorrência do fenômeno La Niña subiria consideravelmente, já que todos os outros modelos simulam um cenário de anomalias abaixo de -0,5°C.
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Previsão probabilística do IRI/CPC aumentou a chance de ocorrência do fenômeno La Niña para 60%. pic.twitter.com/7hd5hZcJFh
É de extrema importância estabelecer premissas reais e efetuar na sequência o julgamento devido dos modelos climáticos, tanto para condições oceânicas quanto para atmosféricas, para que o erro da previsão climática seja reduzido. Ter acesso a mais modelos não significa ter melhor resultado, e sim saber julgar te levará a uma melhor tendência climática.