Quarentena e a oportunidade de entender melhor a poluição atmosférica

A abrupta interrupção da maioria das atividades humanas na quarentena causou uma queda nas emissões de gases estufa. Nesse cenário cientistas tem uma oportunidade única de entender melhor o efeito das atividades humanas e fatores naturais na qualidade do ar de grandes cidades.

Poluição atmosférica e a pandemia
Os cientistas tentam responder por que a redução da poluição do ar durante a quarentena ocorre de forma diferente em diferentes localidades.

Apesar de efeitos negativos para a economia, a quarentena implementada no mundo todo para desacelerar o avanço do coronavírus está trazendo uma oportunidade valiosa para a ciência climática. Medições revelam uma melhoria na qualidade do ar em locais normalmente afetados por grandes concentrações de poluição. As condições atuais permitiram a formulação de uma nova questão para a ciência: por que a redução de poluição ocorre em alguns lugares, mas não em outros?

A paralisação abrupta de uma grande parte das atividades humanas pode ser usada como um experimento científico. Experimentos do tipo são simulados através de modelos numéricos que, apesar de terem melhorado muito ao longo dos últimos anos, ainda apresentam limitações associadas à falta de conhecimento de alguns processos do sistema climático da Terra. Por isso, alguns cientistas acreditam que o que está acontecendo agora pode ser usado como um vislumbre do que pode ser alcançado com políticas e ações climáticas efetivas.

Observações de satélite mostraram uma importante queda nas concentrações de hidróxido de nitrogênio (NO2) na China e Norte da Itália desde o início das medidas de quarentena em Janeiro. O NO2 é um poluente gerado essencialmente por veículos e indústrias que queimam combustíveis fósseis, e afeta não só nosso sistema climático, mas também nossa saúde. Outros poluentes prejudiciais também tiveram sua concentração reduzida, como material particulado, dióxido de enxofre e formaldeídos cancerígenos produzidos por atividade industrial.

Homem x Natureza

O grande desafio é entender o quanto que queda observada na concentração dos poluentes é consequência da quarentena e quanto é por efeitos naturais. O cientista holandês Henk Eskes explica que a concentração de NO2 no Hemisfério Norte (HN) cai naturalmente 50% entre Janeiro e Maio devido ao ângulo do Sol nesse período. Também, a concentração de NO2 e outros poluentes está sujeita a variabilidade diária pelos sistemas do tempo atuantes, já que vento e chuva, ajudam no transporte e dispersão dessas substancias.

No entanto, Eskes afirma que as mudanças observadas na China e Norte da Itália são muito grandes e não podem ser explicadas apenas por efeitos naturais. O cientista defende que mais análises devem ser feitas, incluindo medidas locais e modelagem do transporte atmosférico, para quantificar as mudanças e estabelecer suas causas.

Para confundir mais a situação, a diminuição da poluição do ar não é tão claramente observada em todas as cidades que aderiram a quarentena. Dan Goldberg, um cientista estadunidense, fala que a afirmação de que a concentração de poluentes está caindo nos Estados Unidos é prematura e frágil do ponto de vista estatístico.

Segundo Goldberg, as cidades que apresentaram melhoria na qualidade do ar foram atingidas por chuvas nas últimas semana. É necessário ampliar a pesquisa para entender o possível efeito combinado do fator natural (chuva) e quarentena na concentração de poluição desses locais.