Amazônia sob alerta: lagos estão atingindo temperaturas extremas, causando a morte de centenas de botos

Pesquisa indica que a temperatura de dezenas de lagos da Amazônia está aumentando pelo menos 0,6ºC por década, culminando em um evento de aquecimento catastrófico que matou 209 botos.

Lagos estão atingindo temperaturas extremas, causando a morte de centenas de botos
Pesquisa indica que a temperatura de diversos lagos da Amazônia está aumentando 0,6ºC por década, culminando em evento que matou 209 botos.

Pesquisadores do Instituto Mamirauá em Tefé, Amazonas, fizeram uma descoberta preocupante: nas últimas décadas, as águas dos lagos da Amazônia estão aquecendo de maneira sem precedentes. Por meio de dados de satélites, os pesquisadores identificaram um aumento de 0,6ºC por década na temperatura da superfície da água em pelo menos 25 lagos da Amazônia central.

De acordo com os pesquisadores, o evento mais extremo ocorreu durante a seca de 2023, quando a temperatura da água no lago Tefé chegou a mais de 40ºC a uma profundidade de 2 metros, o que causou a morte de 209 botos, principalmente das espécies boto-cor-de-rosa (Inia Geoffrensis) e tucuxis (Sotalia Fluviatilis).

Lagos estão atingindo temperaturas extremas, causando a morte de centenas de botos
Houve picos de até 41ºC a 2 metros de profundidade em alguns lagos, o que é extremamente incomum. A amplitude térmica diária também foi alta, chegando a 13ºC no dia.

De acordo com Ayan Fleischmann, um dos cientistas responsáveis pela pesquisa, três mortes de botos já soariam um alerta na comunidade. O óbito de 70 animais em um único dia, então, foi um evento absolutamente catastrófico, que desencadeou uma operação emergencial.

Pesquisadores descobrem que a morte dos botos foi causada por condições climáticas

A Operação Emergência Botos Tefé, coordenada pelo Instituto Mamirauá com a colaboração de várias instituições, revelou que a causa da morte dos animais foi a hipertermia provocada por uma combinação de fatores climáticos e ambientais.

Durante a seca de 2023, a Amazônia registrou um recorde de vários dias sem nuvens, o que é raro na região. A ausência de nuvens resultou em uma maior radiação solar direta sobre o lago Tefé, que ainda por cima estava raso e turvo devido à seca, facilitando o aquecimento extremo das águas.

Houve picos de 40 a 41ºC a 2 metros de profundidade, o que é extremamente incomum. A amplitude térmica diária também foi alta, chegando a uma variação de 13ºC ao longo do dia, o que expôs os botos não só a temperaturas altíssimas como também variações muito rápidas. Os botos que habitavam o local não tinham refúgio e acabaram vindo a óbito.

Lagos estão atingindo temperaturas extremas, causando a morte de centenas de botos
O aquecimento generalizado não representa apenas um sério risco para os ecossistemas aquáticos, como também para as comunidades ribeirinhas que dependem das águas para sobreviver.

Uma rede de monitoramento emergencial foi estabelecida entre setembro e outubro de 2023 para medir a temperatura da água em diversos lagos da Amazônia central. Os dados indicaram que mais da metade dos 10 lagos monitorados registraram temperaturas altíssimas, superiores a 37ºC.

Os riscos não se restringem só aos botos, mas também afetam seres humanos

Fleischmann ressaltou que esse aquecimento generalizado representa não apenas um sério risco para os ecossistemas aquáticos, como também para as comunidades ribeirinhas que dependem do rio para transporte e acesso a serviços essenciais. A seca de 2023 foi uma catástrofe humanitária para essas comunidades e também para as áreas urbanas em tributários do rio Amazonas, que ficaram muito isoladas.

Infelizmente, devido às mudanças climáticas, eventos climáticos extremos como esse tendem a se tornar mais frequentes e intensos. Por isso, é urgente implementar programas de adaptação na Amazônia.

Entre as ações necessárias estão a construção de cisternas para captar água da chuva e a perfuração de poços mais profundos para comunidades em terra firme. A distribuição de kits de tratamento emergencial de água e a ampliação da cobertura de tratamento de esgoto também são essenciais. Durante a seca, muitas pessoas tiveram que beber água diretamente do rio, que estava extremamente barrenta e imprópria para o consumo.

Os resultados preliminares do estudo, que está em revisão, foram apresentados em uma mesa-redonda sobre a hidrografia, os aquíferos, as secas e enchentes na Amazônia, realizada na última quinta-feira (11/07) durante a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).