Como o padrão El Niño-Oscilação Sul contribuiu para evolução humana?

Cientistas propõe num novo estudo uma nova teoria a respeito da evolução humana, indicando que padrões climáticos tropicais como o El Niño – Oscilação Sul foram responsáveis por impulsionar mudanças ambientais na África Subsaariana durante períodos importantes da evolução humana.

Evolução Humana
Novo estudo publicado nesse mês na PNAS revela novos detalhes a respeito da relação do clima com a evolução humana.

Um novo estudo publicado nesse mês na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) revelou novas evidências que sugerem que as principais mudanças evolutivas que ocorreram na pré-história foram impulsionadas por antigos padrões climáticos cíclicos nos trópicos, semelhantes ao El Niño- Oscilação Sul (ENOS).

Dados paleoclimáticos dos últimos 600 mil anos do continente africano mostram que a evolução humana pode estar estritamente ligada a antigos padrões de variabilidade climática sobre o Pacífico Tropical semelhantes ao El Niño-Oscilação Sul.

Em uma colaboração internacional, diversos cientistas de diferentes países da Europa, África e Estados Unidos, analisaram dados climáticos obtidos de sedimentos de lagos no Quênia, Malaui, Etiópia e Gana, além de sedimentos vindos do fundo do mar da costa da Tanzânia, Namíbia, Congo, Mauritânia, Líbia e Egito.

Exemplos de amostras de sedimentos coletados do fundo do oceano. Fonte: Wikimedia/ Hannes Grobe.

Com esses dados os cientistas puderam criar um grande histórico climático africano dos últimos 620 mil anos capaz de fornecer informações a respeito de quando e onde as condições úmidas ou secas prevaleceram no continente.

A paleoclimatologista, Dra Stefanie Kaboth-Bahr, que liderou o estudo, disse: “Ficamos surpresos ao encontrar uma 'gangorra' climática distinta leste-oeste muito semelhante ao padrão produzido pelo fenômeno meteorológico El Niño, que hoje influencia profundamente a distribuição de precipitação na África".

As influências do Oceano Pacífico Tropical

Os autores inferiram que períodos alternados de aquecimento e resfriamento do Oceano Pacífico Tropical, embalados pelas mudanças de insolação (decorrentes de mudanças no eixo de rotação da Terra, por exemplo), modulavam a circulação de Walker (célula de circulação zonal sobre a região tropical que modula o regime de chuvas) que, por sua vez, acarretava numa espécie de padrão de dipolo (ou gangorra) de condições secas e úmidas entre a África oriental e ocidental.

Os dados mostram que essas alternâncias das condições úmidas e secas ocorriam em escalas de tempo de aproximadamente 100 mil anos, com cada alternância sendo acompanhada por drásticas mudanças na flora e fauna.

De acordo com a Dra. Kaboth-Bahr, esta alternância entre períodos secos e úmidos parece ter governado a dispersão e a evolução da vegetação, bem como dos mamíferos na África oriental e ocidental. Essas constantes mudanças foram cruciais para a evolução humana e demografia inicial no continente considerado o berço da humanidade.

O aquecimento (El Niño) ou esfriamento (La Niña) das águas do Oceano Pacífico Tropical altera a grande célula de circulação zonal de Walker, alterando então o regime de chuvas em toda região tropical do globo. Fonte: NOAA/Climate.gov.

Os autores ressaltam no estudo que esses padrões alternadamente úmidos e secos entre as porções leste e oeste do continente tiveram um impacto mais profundo na África Subsaariana dos que os ciclos glacias e interglaciais, que até então eram mais comumente associados as principais evoluções da espécie humana. Dessa forma, o estudo fornece a ciência uma nova perspectiva sobre a ligação entre as flutuações ambientais e a origem dos nossos primeiros ancestrais.

“A reavaliação desses padrões de estagnação, mudança e extinção por meio de uma nova estrutura climática trará novos insights sobre o profundo passado humano. Isso não significa que as pessoas ficaram indefesas diante das mudanças climáticas, mas as mudanças na disponibilidade de seu habitat certamente teriam impactado padrões demográficos e, em última instância, as trocas genéticas que sustentam a evolução humana”, afirma a Dra. Kaboth-Bahr.