Como uma viagem ao espaço modificou o corpo de quatro tripulantes civis
Em um compilado de artigos, publicado recentemente na revista Nature Portfolio, cientistas descrevem os diferentes efeitos do espaço na saúde dos tripulantes. Veja o que eles descobriram.
Primeiramente, vamos falar da Inspiration4. Em 2021, a SpaceX, empresa espacial de Elon Musk, enviou quatro tripulantes civis a bordo de um foguete para uma viagem curta, de três dias, pela órbita da Terra, a chamada missão Inspiration4. Foi o primeiro voo realizado com financiamento privado a levar civis para fora do planeta.
Os quatro tripulantes decolaram às 21h03 do Complexo de Lançamento 39A no Centro Espacial Kennedy da NASA na Flórida (Estados Unidos), no dia 15 de setembro de 2021.
Bom, e agora vem a notícia deste artigo: cientistas de várias instituições ao redor do mundo se juntaram para analisar os dados que foram coletados junto a esses tripulantes, e divulgaram um material inédito sobre como a estadia no espaço pode impactar a saúde humana. Esse material é uma coletânea de 44 estudos que eles publicaram, e que foi nomeado de Space Omics and Medical Atlas (SOMA), sendo divulgado na última terça-feira (11) na revista Nature Portfolio.
Um estudo inédito e mais detalhado
Christopher Mason, geneticista da Weill Cornell Medicine que liderou boa parte dos estudos, explicou que embora a NASA já tenha estudado a saúde de astronautas nos últimos anos, os voos privados possibilitam a avaliação dos riscos de forma mais detalhada. E foi isso que ele e os demais cientistas fizeram.
Os tripulantes foram submetidos a monitoramento médico antes, durante e depois da viagem ao espaço. Com os dados coletados (dados moleculares, celulares, fisiológicos e fenotípicos) e de voos espaciais, os pesquisadores fizeram uma série de análises. As análises são referentes aos genomas, microbiomas, transcriptomas (RNA mensageiro) e proteomas (proteínas) das pessoas.
Além disso, a análise com a tripulação dessa missão é diferenciada pois o foguete da SpaceX orbitou a Terra a 585 km acima do solo. A altitude é significativamente mais elevada do que a da Estação Espacial Internacional (ISS), sujeitando os tripulantes a outro ambiente de radiação, provavelmente mais intenso.
Os efeitos colaterais do espaço no corpo humano
Em órbita, a tripulação realizou uma bateria de experimentos científicos, os quais foram processados, sequenciados e analisados pelos cientistas. Então, eles encontraram cinco principais efeitos colaterais percebidos após o retorno dos civis à Terra. São eles: alterações no transcriptoma (o conjunto completo de moléculas de RNA expressas); no epigenoma (o conjunto de sinalizadores bioquímicos ao longo do genoma); nas dinâmicas celulares; na movimentação do microbioma; e nas respostas mitocondriais.
Observou-se nos tripulantes: perda muscular, biomarcadores de velhice em seus organismos e inflamação na pele. Os efeitos estão muito relacionados ao estresse físico sofrido por conta do voo. O voo espacial afetou a transcrição dos genes do sistema imunológico, possivelmente reduzindo a capacidade do corpo de se defender contra vírus.
Foi notado também uma diferenciação em relação ao gênero: as duas tripulantes do sexo feminino tiveram um retorno mais rápido aos níveis normais de seus sistemas imunológicos do que os dois tripulantes homens.
Tejaswini Mishra, geneticista da Universidade de Stanford, comentou que homens e mulheres enfrentam riscos diferentes no espaço e se recuperam em taxas diferentes após retornar à Terra.
Por fim, a mensagem final que o estudo SOMA deixa é que os astronautas enfrentam riscos de saúde, mesmo em viagens curtas no espaço. E os pesquisadores que produziram o SOMA estão expandindo seus estudos, examinando dados de astronautas que viajaram para a ISS em voos espaciais da empresa Axiom Space.
Referências da notícia:
Nature Portfolio. “Space Omics and Medical Atlas (SOMA) across orbits”. 2024.
Science. “Astronauts face health risks—even on short trips in space”. 2024.