Pegadas fósseis no Quênia sugerem que duas espécies humanas diferentes coexistiram antigamente
Um estudo recente relata a descoberta de fósseis de pegadas no Quênia, que indicam que diferentes espécies de hominídeos compartilhavam o mesmo habitat há cerca de 1,5 milhão de anos.
Um estudo recente publicado na revista Science descreve uma descoberta interessante. Pesquisadores encontraram nas margens de um antigo lago no Quênia pegadas fósseis que indicam que duas espécies de humanos primitivos teriam compartilhado o mesmo ambiente há cerca de 1,5 milhão de anos. Acompanhe abaixo mais detalhes dessa descoberta e o que ela representa para a história da humanidade.
Como se deu a descoberta
Uma equipe de cientistas descobriu as pegadas em 2021, perto do Lago Turkana na região de Koobi Fora, um sítio arqueológico no Quênia. Foi identificada uma trilha de 12 pegadas, medindo cerca de 26 centímetros cada e atribuídas a um Paranthropus boisei adulto, com base no formato e maneira de locomoção. Essas pegadas foram inicialmente cobertas com areia fina para preservação até que uma escavação detalhada pudesse ser realizada.
Então, em 2022, a equipe escavou uma área de 23 m² de sedimentos, revelando 11 novas trilhas, aparentemente deixadas pelo mesmo indivíduo, além de três pegadas isoladas em direção quase perpendicular à trilha principal de 12 pegadas.
Essas três pegadas mediam entre 20,5 e 23,5 centímetros e eram semelhantes à pegada das espécies modernas. Duas delas estavam completas o suficiente para serem atribuídas à espécie Homo erectus, possivelmente um jovem.
O que as pegadas fósseis representam
As pegadas, atribuídas ao Homo erectus e ao Paranthropus boisei, foram feitas em um curto intervalo de tempo, apenas horas de diferença, ou talvez alguns dias, sugerindo que ambas as espécies compartilharam o habitat simultaneamente e possivelmente interagiram. Contudo, não há evidências dessa interação entre eles.
Embora ambas as espécies fossem bípedes, as pegadas mostram que apresentavam estilos distintos de caminhar, apontando para uma diversidade comportamental significativa. Isso foi descoberto após análises de imagens 3D detalhadas das trilhas, que indicaram diferentes padrões de marcha, postura e movimento.
“É surpreendente que você tivesse duas espécies de hominídeos de tamanho similar e corpo grande na mesma paisagem”, disse Kevin Hatala, autor principal do estudo e paleoantropólogo da Universidade Chatham, em Pittsburgh.
Hatala ainda comenta que "é possível que elas tenham competido diretamente, mas também é possível que não estivessem em competição direta e ambas tivessem acesso aos recursos de que precisavam nessa paisagem compartilhada". As diferenças alimentares podem ter atenuado a competição.
"As pegadas fósseis nos trazem uma visão clara de um instante do tempo, há 1,5 milhão de anos. Os diferentes ancestrais humanos podem muito bem ter passado um pelo outro, caminhando pela água rasa, possivelmente caçando ou socializando", comentou Louise Leakey, diretora do Koobi Fora Research Project e coautora do estudo.
Quem eram esses hominídeos?
O Paranthropus boisei, mais distante dos humanos modernos, viveu entre 2,3 milhões e 1,2 milhão de anos atrás, chegando a 1,37 metro de altura. Tinha um crânio adaptado para abrigar grandes músculos responsáveis pela mastigação, incluindo uma crista craniana como a dos gorilas machos. Também tinha grandes dentes molares e seus pés se assemelhavam aos dos macacos, incluindo o dedão.
Já o Homo erectus, um membro das etapas iniciais da nossa linha evolutiva e com proporções corporais como as do Homo sapiens, viveu entre 1,89 milhão e 110 mil anos atrás, e alcançava 1,85 metro de altura. Suas sobrancelhas eram grandes e os seus cérebros maiores do que os dos Paranthropus boisei, embora menores que os nossos nos dias atuais.
Referências da notícia:
Hatala, K. G. et al. Footprint evidence for locomotor diversity and shared habitats among early Pleistocene hominins. Science, v. 386, n. 6725, 2024.
Reuters. “Fossil footprints in Kenya show two ancient human species coexisted”. 2024.