Será que os humanos conseguiriam sobreviver no planeta fictício de Duna?
Esta foi a pergunta feita por alguns cientistas, que usaram a modelagem para simular o clima de Arrakis, o planeta fictício do filme Duna e, assim, responder essa pergunta. Eles queriam saber se a física e o ambiente deste planeta se comparavam a um modelo climático real.
Duna é um filme épico de ficção científica lançado em 2021, dirigido por Denis Villeneuve e escrito por Jon Spaihts, Villeneuve e Eric Roth, e se baseia na série de livros de mesmo nome de Frank Herbert publicada em 1965. É o primeiro filme da adaptação dessa obra (que fez muito sucesso na sua estreia, diga-se de passagem), e o segundo (‘Duna: Parte 2’) está previsto para ser lançado no final deste ano.
O filme se passa em um futuro distante no planeta deserto de Arrakis, também conhecido como Duna, onde há uma luta pela substância mais valiosa e rara do universo, a chamada “melange”, usada para estender a vida humana, viajar à velocidade da luz e garantir poderes sobre humanos.
A sobrevivência em Duna, ou Arrakis, é um grande desafio. Embora as areias desérticas possuam tal especiaria valiosa, as altas temperaturas fazem com que até mesmo o povo que habita aquela região tenha que se adaptar para resistir ao calor. Isso sem falar da escassez de água, que força as pessoas a reaproveitarem a umidade e suor do próprio corpo.
Então, afinal, os humanos conseguiriam sobreviver em um local tão inóspito quanto este? Cientistas especialistas em modelagem climática simularam as condições do planeta Arrakis para responder isso. O resultado da simulação foi descrito em um artigo para o site 'The Conversation'.
As simulações do planeta Arrakis
Os pesquisadores, da Universidade de Bristol e da Universidade de Sheffield, ambas no Reino Unido, usaram um modelo climático comumente utilizado para prever o tempo e o clima aqui na Terra. A ideia, segundo eles, é entender como aquele planeta fictício funciona a partir das leis da Física que a gente conhece. Eles decidiram manter as mesmas leis físicas fundamentais que regem o tempo e o clima aqui na Terra.
Então, eles precisaram informar ao modelo (inserindo como dados de entrada) certas coisas sobre Arrakis, com base nas informações encontradas nos livros e em outras fontes. Tais coisas incluem a topografia do planeta e sua órbita, que era essencialmente circular, semelhante à Terra hoje.
E por fim, eles informaram ao modelo a composição atmosférica daquele planeta. Na maior parte, é bastante semelhante à da Terra hoje, porém com menos dióxido de carbono. A grande diferença está na concentração de ozônio (O³). Na Terra, há pouquíssimo O³ na baixa atmosfera, apenas cerca de 0,000001% da composição. Já em Arrakis, a concentração é de 0,5%, o que justifica muito o calor infernal que faz lá.
Assim, depois de fornecer todos os dados necessários, eles foram capazes de entender desde a força da luz solar sobre a areia até a composição da atmosfera de Arrakis.
O interessante é que você pode interagir com a simulação acessando o site Climate Archive, para ampliar recursos específicos e destacar informações que deseja ver, como temperatura, precipitação e velocidade do vento. Na imagem acima é mostrada a direção do vento (setas brancas), o relevo (montanhas) e as nuvens (sombreados brancos).
Características simuladas de Arrakis
Após as simulações, os cientistas concluíram que o clima de Arrakis é basicamente plausível. Tirando alguns fatores, muito de Arrakis poderia sim ser habitável, embora fosse inóspito. Alex Farnsworth, meteorologista da Universidade de Bristol e colaborador do projeto, disse que ficou muito surpreso com a precisão de Frank Herbert ao “imaginar um mundo desértico sem ter formação em física ou um supercomputador para realizar qualquer tipo de cálculo”.
Segundo o modelo, os meses mais quentes nos trópicos atingem cerca de 45°C, enquanto os meses mais frios tem temperaturas de até 15°C, condições semelhantes às da Terra. As temperaturas mais extremas ocorreriam em latitudes médias e nas regiões polares. Nestas regiões, o verão poderia chegar a 70°C na areia, algo que também foi sugerido no livro do autor da obra, e o inverno varia de -40°C a -70°C.
No modelo, as regiões polares de Arrakis têm significativamente mais umidade atmosférica e alta cobertura de nuvens que atua para esquentar o clima, já que o vapor d’água é um gás de efeito estufa. Além disso, ele sugere que ocorreriam quantidades bem pequenas de chuva, confinadas apenas às latitudes mais altas no verão e no outono, e apenas em montanhas e planaltos, diferentemente do livro, que diz que não chove em Arrakis.
O livro menciona que as calotas polares existem, pelo menos no Hemisfério Norte, e há bastante tempo. Esta é a maior diferença em relação às simulações, que sugerem que as temperaturas no verão derreteriam qualquer gelo polar e não haveria gelo para reabastecer as calotas no inverno.
Afinal, seria possível sobrevivermos em Arrakis?
Levando tudo isso em conta, é possível imaginar, sim, que os humanos podem mesmo sobreviver em um planeta tão desértico quanto Arrakis. Atente-se que só foram analisadas aqui as condições atmosféricas para sobrevivência, não entra em questão a sobrevivência aos vermes gigantes das areias, antes que algum fã pergunte.
Considerando que os personagens do filme são tão humanos quanto nós, haveria condições para que a humanidade habitasse o planeta, mas nas regiões tropicais onde as temperaturas são mais amenas e, de certa forma, parecidas com as da Terra. Nas áreas de maior latitude, as coisas seriam um pouco mais difíceis, já que se trata de um clima mais extremo e brutal.
Dando um exemplo prático, as condições das regiões tropicais de Duna não são tão diferentes daquelas que o Centro-Oeste do Brasil apresenta em termos de altas temperaturas e baixa umidade do ar. Então se alguém sobrevive em Cuiabá ou em Brasília, por exemplo, em Arrakis também seria possível.