Um evento climático extremo e incomum entre 2014 e 2016 resultou em um abrupto aumento global do nível do mar

Entre 2014 e 2016 foi registrado um repentino aumento do nível global do mar, bem maior que o esperado. Um novo estudo mostra que essa elevação abrupta pode ter sido consequência do El Niño e suas alterações nos padrões de chuva!

Dentro do período de junho de 2014 e maio de 2016 o nível médio do mar aumentou impressionantes 15 milímetros, ou 0.6 polegadas. Pode não parecer muito, afinal esse comprimento não é muito maior que o tamanho de uma unha, mas em relação às tendências de longo prazo, esse foi um salto assustador que surpreendeu especialistas!

De acordo com dados de satélite da NASA, desde 1993 o nível médio global do mar subiu mais de 9 centímetros, cerca de 3.5 polegadas. A partir disso, pela estimativa da taxa de elevação anual dos oceanos, os cientistas esperavam que o nível médio do mar subisse cerca de 8 milímetros entre 2014 e 2016, mas o aumento registrado do nível global do mar foi quase o dobro do esperado!

Após anos de especulações a respeito desse súbito aumento dos oceanos globais, um novo estudo realizado por uma equipe do Laboratório de Oceanografia Física e Espacial da Universidade Brest, na França, revelou os prováveis eventos climáticos responsáveis por esse aumento incomum e um deles é um padrão muito bem conhecido: o El NIño-Oscilação Sul (ENOS)!

O efeito do El Niño nos oceanos globais

De acordo a pesquisa publicada na Geophysical Research Letters, além da evidente tendência linear de aumento do nível médio do mar de cerca de 4 mm por ano, para o período de 2006 a 2016, há uma grande variabilidade interanual inserida na série, e essa variabilidade está diretamente associadas aos eventos de El Niño e La Niña.

De acordo com o novo estudo, a seca sobre a Amazônia, devido a atuação do El Niño - fase positiva do El Niño - Oscilação Sul (ENOS) - pode estar associada a um aumento global do nível do mar!

Os autores verificaram nos dados globais que houve uma redução de 5 mm no nível médio do mar durante o evento de La Niña de março de 2010 a maio de 2011, enquanto o aumento de 15 mm entre junho de 2014 a maio de 2016 ocorreu em fase com dois eventos sucessivos de El Niño, sendo um deles,o de 2015/16, o mais intenso dos registros históricos.

O El Niño de 2015/16, o mais intenso dos registros até então, foi um dos principais responsáveis pelo súbito aumento do nível médio do mar entre 2014 e 2016. Imagem: Climate.gov/NOAA.

No estudo os autores explicam que são dois os principais fatores que impulsionam o aumento do nível global do mar: à expansão térmica associada ao aquecimento global dos oceanos (conhecido como nível termoestérico médio global) e o aumento da massa oceânica global (conhecido como nível baristático). Este último aumenta em resposta ao derretimento das massas de gelo continentais (Groenlândia e Antártica), às geleiras das montanhas e à mudança no armazenamento de água terrestre. Mas quanto cada um deles influenciou no aumento registrado entre 2014 e 2016?

Os resultados da pesquisa indicam que no período em questão, de uma forma surpreendente, a contribuição baristática, ou seja, o aumento da massa oceânica, teve uma contribuição muito significativa, de 12 mm, do aumento do nível do mar, que corresponde a 80% do total registrado. Os 20% restantes (3 mm) estariam associados a expansão térmica devido ao aquecimento dos oceanos.

A seca na bacia amazônica, ocasionada pela falta de chuvas gerada pelo El Niño, foi o principal fator que impulsionou o aumento do nível do mar, segundo estudo.

Mas o que esteve por trás desse aumento da massa oceânica global? Para responder essa questão, os pesquisadores analisaram dados de satélites, dados oceânicos e inclusive dados de armazenamento de água em terra, como a de grandes bacias hidrográficas, como a Bacia Amazônica. Com esses dados, eles verificaram que grande parte da contribuição (cerca de 52%) veio da América do Sul, mais especificamente da Amazônia!

Esses eventos incomuns do El Niño afetaram o padrão de precipitação em todo o mundo, diminuindo o armazenamento de água terrestre na bacia amazônica e, portanto, levando a um aumento da massa média global do oceano (Llovel et al., 2023)

Durante eventos de El NIño a célula de circulação tropical sobre o Pacífico é alterada, de forma que passa a ocorrer mais precipitação sobre o Oceano Pacífico Tropical central e leste e menos sobre a Amazônia - como a atual situação de seca que registramos nos dias de hoje devido ao El NIño. Esse excesso de chuvas sobre o Pacífico e déficit sobre a bacia amazônica, que reteve menos água que o normal, fez com que ocorresse esse aumento da massa global dos oceanos, que ainda teve a contribuição do degelo registrado nos pólos nesse mesmo período.